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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 01212/14 Data do Acordão: 11-03-2015 Tribunal: 2 SECÇÃO Relator: DULCE NETO Descritores: GARANTIA BANCÁRIA INCORPORAÇÃO BANCO SUBSTITUIÇÃO PRESSUPOSTOS Sumário: I - A competência para a análise e decisão da questão relativa à necessidade de substituição de garantia prestada para manter suspensa a execução fiscal cabe exclusivamente à administração tributária, pelo que, na reclamação deduzida contra o acto que determinou a substituição da garantia bancária prestada por outra de igual valor, o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto reclamado tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face da sua fundamentação contextual, até porque o interessado só pode defender-se dos pressupostos que aí foram enunciados e dos quais se distraíram os efeitos lesivos. O que significa ser absolutamente inadmissível qualquer tentativa judicial de justificar o acto por razões de facto e de direito que não constam da sua fundamentação. II - Não é legalmente correcto afirmar que as garantias, para poderem ser consideradas “idóneas” para efeitos de suspensão da execução fiscal, tenham necessariamente de ser garantias especiais, nunca podendo ser constituídas pelo próprio património do devedor (garantia geral das obrigações), e que a circunstância de a operação de fusão/incorporação do banco devedor no banco que prestou a garantia bancária leve à transmutação da garantia bancária autónoma prestada numa mera garantia geral da obrigação tributária. III - O fundamento invocado no acto reclamado não integra o elenco dos pressupostos que a lei prevê para possibilitar a exigência de prestação de nova garantia, nem constitui parâmetro relevante no juízo de aferição da idoneidade da garantia bancária prestada e oportunamente aceite como idónea, só podendo a AT exigir a sua substituição por outra se pudesse concluir, perante razões concretas e objectivas que teriam de estar enunciadas na fundamentação do acto, que aquela já não garante, em concreto, o integral pagamento da quantia exequenda e do acrescido. Pelo que, ao utilizá-lo, a AT incorreu em violação de lei determinante da anulação do acto reclamado. Página 1 de 27 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo 23-03-2015 http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/232b1ef63cfaa1c68...

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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal AdministrativoProcesso: 01212/14Data do Acordão: 11-03-2015Tribunal: 2 SECÇÃORelator: DULCE NETODescritores: GARANTIA BANCÁRIA

INCORPORAÇÃOBANCOSUBSTITUIÇÃOPRESSUPOSTOS

Sumário: I - A competência para a análise e decisão da questão relativa à necessidade de substituição de garantia prestada para manter suspensa a execução fiscal cabe exclusivamente à administração tributária, pelo que, na reclamação deduzida contra o acto que determinou a substituição da garantia bancária prestada por outra de igual valor, o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto reclamado tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face da sua fundamentação contextual, até porque o interessado só pode defender-se dos pressupostos que aí foram enunciados e dos quais se distraíram os efeitos lesivos. O que significa ser absolutamente inadmissível qualquer tentativa judicial de justificar o acto por razões de facto e de direito que não constam da sua fundamentação.II - Não é legalmente correcto afirmar que as garantias, para poderem ser consideradas “idóneas” para efeitos de suspensão da execução fiscal, tenham necessariamente de ser garantias especiais, nunca podendo ser constituídas pelo próprio património do devedor (garantia geral das obrigações), e que a circunstância de a operação de fusão/incorporação do banco devedor no banco que prestou a garantia bancária leve à transmutação da garantia bancária autónoma prestada numa mera garantia geral da obrigação tributária.III - O fundamento invocado no acto reclamado não integra o elenco dos pressupostos que a lei prevê para possibilitar a exigência de prestação de nova garantia, nem constitui parâmetro relevante no juízo de aferição da idoneidade da garantia bancária prestada e oportunamente aceite como idónea, só podendo a AT exigir a sua substituição por outra se pudesse concluir, perante razões concretas e objectivas que teriam de estar enunciadas na fundamentação do acto, que aquela já não garante, em concreto, o integral pagamento da quantia exequenda e do acrescido. Pelo que, ao utilizá-lo, a AT incorreu em violação de lei determinante da anulação do acto reclamado.

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Nº Convencional: JSTA000P18697Nº do Documento: SA22015031101212Data de Entrada: 03-11-2014Recorrente: FAZENDA PÚBLICARecorrido 1: BANCO Z........, S.A.Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC

Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A FAZENDA PÚBLICA interpõe recurso da sentença proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a reclamação judicial deduzida pelo Banco Z………, S.A., ao abrigo do disposto nos arts. 276º e segs. do CPPT, do despacho proferido no âmbito do processo de execução fiscal nº 3085199901036980 e que determinou a substituição da garantia bancária anteriormente prestada por outra de igual valor.

1.1. Terminou a alegação de recurso com as seguintes conclusões:A. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a RFP conformar-se com o decidido, entendendo que a douta sentença padece de erro de julgamento de direito, designadamente pela violação do disposto nos arts. 52º da LGT e nos arts. 169º e 199º do CPPT.

B. Da conjugação destas disposições, resulta que a suspensão do PEF depende sempre da prestação e manutenção de garantia idónea.

C. Antes de avançar para uma noção de garantia idónea, importa aferir qual a definição de garantia no âmbito do Direito das Obrigações.

D. Ainda que não exista uma noção legal de garantia, esta há-de constituir um instrumento de tutela do direito do credor à realização da prestação.

E. A doutrina tradicional tem estabelecido uma distinção entre a garantia geral ou comum e as garantias especiais.

F. A garantia geral ou comum é constituída pelo conjunto de bens penhoráveis que compõem o património do devedor, sendo que, considerando que é uma realidade flutuante e que todos os credores do devedor estão em posição de igualdade, a mesma pode tornar-se

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insuficiente, sendo até questionável se a mesma consiste numa verdadeira garantia.

G. Assim, o credor que pretenda obviar a tal situação, deverá recorrer a uma garantia especial, que representa um reforço suplementar de segurança em relação à garantia comum, e que tanto poderá ser pessoal ou real.

H. No caso da garantia pessoal, esse reforço consiste em instituir uma obrigação secundária, assumida por uma pessoa diferente, o que implica uma segunda aplicação, também em relação a este, do mecanismo da garantia geral das obrigações.

I. Pelo contrário na garantia real, esse reforço traduz-se antes em instituir uma afetação de bens, quer do devedor quer de terceiro, ao pagamento preferencial de certas dívidas.

J. Da análise do elenco dos tipos de garantias enunciadas no art. 199º do CPPT, é patente a opção do legislador pelas garantias especiais, quando institui a possibilidade do devedor obter a suspensão do PEF por via da prestação de garantia idónea.

K. De todo o exposto, uma garantia só poderá ser idónea se, através dela, for possível tal reforço quantitativo ou qualitativo.

L. In casu,a garantia que foi apresentada pelo X………, para suspender a execução fiscal, foi uma garantia autónoma prestada pela ora reclamante.

M. Da noção de garantia autónoma, depreende-se que, em abstracto, esta consiste num reforço quantitativoatravés do alargamento dos bens sobre qual o credor poderá satisfazer o ser crédito, pelo que deverá ser considerada uma garantia especial (do tipo pessoal).

N. No entanto, se atentarmos ao caso concreto, verificamos que tal reforço quantitativo, caracterizador das garantias especiais, deixou de existir por via da incorporação do património da executada no património da garante, fruto da operação de fusão ocorrida entre as duas, pelo que não poderá continuar a ser considerada idónea.

O. Perante o incumprimento da ora reclamante, que assumiu as obrigações do X…………, apenas os bens que

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integram o seu património geral servirão para o cumprimento da dívida, não tendo o credor tributário qualquer privilégio perante os demais credores, situação que o legislador pretendeu evitar quando institui a necessidade de prestação de garantia idónea para suspensão da execução fiscal.

P. A sentença recorrida labora pois num erro quando conclui que a garantia prestada é a mesma, pois, esta já não tem em si, a característica típica da garantia especial, ou seja, o reforço quantitativo.

Q. Nem se pode defender que a característica da autonomia da garantia possa constituir tal reforço quantitativo, pois tal característica tem antes a ver com a forma como a obrigação é assumida pelo terceiro garante e já não qualquer alargamento de bens sobre qual o credor poderá satisfazer o ser crédito.

R. Acresce que a garantia autónoma institui uma relação triangular, que, in casu, por via da fusão da executada no garante (ora reclamante), deixou de existir.

S. Nem se percebe como se pode defender que, perante o incumprimento do devedor, o crédito do credor esteja salvaguardado pela garantia autónoma prestada por esse mesmo devedor, agora na posição de garante.

T. É que, o aspecto central das garantias “é que não sejam atingidas pela insolvência do devedor”, pelo que, elas serão imprestáveis se não protegerem de forma eficaz os credores neste casos.

U. Ora, in casu, se devedor e garante são uma e mesma pessoa, é evidente que tal protecção em caso de insolvência não está assegurada, pois os bens são os mesmos.

V. Acresce que, o legislador não institui qualquer isenção de prestação de garantia no caso de o executado ser uma instituição bancária, pois, ainda que estejam sujeitas a uma rigorosa supervisão da sua actividade, tal não invalida que as mesmas não possam entrar em situação de incumprimento generalizado.

W. Aliás, as próprias instituições que supervisionam estas instituições bancárias (Banco de Portugal e Banco Central

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Europeu), exigem, não raras vezes, a constituição de garantias especiais para concessão de empréstimos.

X. De todo o exposto, entende a RFP que o tribunal a quo errou o seu julgamento, devendo a sentença ser revogada, com as legais consequências.

Y. A sentença evidencia também um erro material que carece de correcção, nos termos do art. 614º do CPC.

Z. É que, a Fazenda Pública foi condenada em custas, nos termos do nº 1 do art. 527º do CPC, no entanto, a sentença não determina o valor da causa, que, deverá ser fixado na sentença, nos casos em que não haja lugar a despacho saneador, nos termos do nº 1 e 2 do art. 306º do CPC.

AA. Acresce que a fixação do valor da causa mostra-se relevante para efeitos de determinação da taxa de justiça, como resulta do art. 6º do RCP.

BB. Impondo-se então que a sentença seja rectificada de modo a que passe a constar o valor da causa, que deverá ser fixado atendendo ao estatuído na al. e) do nº 1 do art. 97º-A do CPPT.

1.2. O Recorrido Banco Z……… apresentou contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo:a. A garantia bancária autónoma, como a que releva no presente recurso, é um negócio jurídico mediante o qual uma instituição de crédito (garante) assume, em nome e por conta própria, a obrigação de pagar a um terceiro beneficiário determinada quantia em dinheiro no caso de incumprimento ou inexecução por parte do devedor.

b. A função da garantia autónoma não é a de garantir o pontual cumprimento de uma determinada obrigação (no caso de garantia prestada em execução fiscal, a dívida exequenda), antes é a de assegurar que o beneficiário receberá, nas condições previstas no próprio texto da garantia, uma determinada importância pecuniária, e esta função em nada é prejudicada pela reunião na mesma pessoa da qualidade de devedor e garante, pois que a relação relevante na perspectiva do beneficiário é a que foi por si estabelecida com o garante.

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c. Não se trata assim, como erradamente afirma a Recorrente, de deixar ou não deixar “de existir por via da incorporação do património da executada no património da garante, fruto da operação de fusão ocorrida entre as duas[um] reforço quantitativo [da garantia geral das obrigações]”, mas de concluir se a obrigação de resultado assumida pelo garante perante o beneficiário da garantia se altera por força da fusão. E, concluindo-se em sentido negativo, como é devido, em nada é prejudicada a expectativa do credor quanto à cobrança da quantia exequenda.

d. Acresce que não se verificam, no caso concreto, os pressupostos de que depende a possibilidade de exigência de reforço da garantia ou a prestação de nova garantia nos termos do número 10 do artigo 199º do CPPT, que exige para o efeito uma “diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia.”

e. Ora não foi demonstrada no caso concreto (nem poderia plausivelmente tê-lo sido), sequer foi invocada pelo órgão de execução fiscal ou pela Recorrente qualquer “diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia”: a obrigação de pagamento assumida pelo Recorrido mediante a garantia bancária nº 125-02-0232464 mantém-se inalterada em todos os aspectos que relevam na relação com o beneficiário da garantia.

f. Nem se diga que a fusão do devedor originário no Recorrido, também garante, determinou a confusão entre garante e devedor, com a consequente extinção da garantia nº 125-02-0232464, precisamente por força da autonomia desta.

g. Em qualquer hipótese, nos termos do artigo 871º do Código Civil, aplicável por analogia no caso de garantias autónomas, a reunião na mesma pessoa das qualidades de devedor e garante não determina necessariamente a extinção da garantia, dependendo tal consequência da inexistência de interesse do credor na sua manutenção. Considerando que a incorporação pelo Recorrido da sociedade originariamente devedora ocorreu em 28 de Junho de 2004 e foi comunicada ao credor, nos termos da lei, no prazo de 30 dias a contar da fusão, sem que o credor tenha então (e até à decisão contestada, 10 anos depois) suscitado qualquer questão quanto à garantia, o Recorrido concluiu, legitimamente, que o credor teria

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interesse na sua manutenção, ou seja, na sua não extinção por confusão.

h. Não procede, por fim, a conclusão quanto à inidoneidade da garantia em análise que parece estar subjacente à decisão reclamada já que, conforme conclui o Supremo Tribunal Administrativo no seu acórdão de 14 de Agosto de 2013 proferido no processo nº 01315/13, “[a] idoneidade da garantia bancária deve ser apreciada pelo órgão competente da AT caso a caso, em concreto, exclusivamente em face da susceptibilidade de responder pela dívida exequenda e pelo acrescido, designadamente averiguando da suficiência e solidez da garantia oferecida e da solvência da entidade garante.”

i. Em conformidade, bem decidiu a Mmª Juiz a quo quando concluiu pela irrelevância, para efeitos da validade ou idoneidade da garantia nº 125-02-0232464, da incorporação, no Recorrido, do executado originário no presente processo de execução, não merecendo tal decisão a censura que lhe é apontada pela Recorrente.

1.3. O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de que, quanto à questão da omissão de fixação do valor da causa, podendo essa omissão «constituir mero erro material susceptível de rectificação, nos termos do art. 614º do CPC, deverá essa rectificação ter agora lugar, uma vez que a questão só no presente recurso foi suscitada», e, quanto à questão do erro de julgamento imputado à sentença, no sentido de que fosse negado provimento ao recurso, com o seguinte discurso argumentativo:

«A garantia prestada para suspensão da execução fiscal pode ser substituída em duas situações:- Por iniciativa do executado e a título excepcional, nos termos do nº 7 do art. 52º da LGT;- Por ordem do órgão da execução fiscal, nos termos do nº 10 do art. 199º do CPPT.É esta última situação que importa analisar no presente recurso.

Dispõe o nº 10 do art. 199º do CPPT que “em caso de diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia, o órgão da execução fiscal ordena ao executado que a reforce ou preste nova garantia idónea no prazo de 15 dias”, sob pena da execução prosseguir os

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seus termos, com penhora dos bens e direitos considerados suficientes para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido (nºs 8 e 4 do preceito).

No caso vertente, em cumprimento do despacho proferido em 18.06.2014, foi o reclamante, ora recorrido, notificado para substituir a garantia bancária prestada pelo executado Banco X……… para suspensão do processo de execução fiscal, “por outra de igual valor, em virtude, por via da incorporação do património do devedor principal no património do garante, aquela garantia ter passado a integrar a garantia geral da obrigação tributária, prevista no art. 50º da LGT, deixando de poder ser considerada idónea para efeitos de suspensão da execução fiscal, sendo necessário para tal, a prestação de uma garantia especial da obrigação em face do exposto no nº 1 do art. 199º do CPPT”.

A reclamada ordem de substituição da garantia fundamenta-se, portanto, na superveniente inidoneidade da mesma pelo facto de se ter verificado a incorporação do património do executado inicial no património do garante, ora recorrido.

Ora, como claramente decorre do citado nº 10 do art. 199º do CPPT, o reforço ou a prestação de nova garantia idónea só pode ser exigido se a garantia se tomar manifestamente insuficiente para o pagamento da dívida exequenda e do acrescido e esse pressuposto não se encontra minimamente demonstrado na factualidade levada ao probatório nem sequer vem invocado no despacho reclamado (cfr. Jorge Lopes de Sousa, in CPPT Anotado e Comentado, 6.ª edição, vol. III, p. 415).

De todo o modo, como se salienta no douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 14-08-2013 - Rec. 1315/13, «o juízo sobre a idoneidade da garantia há-de resultar da avaliação que for efectuada em concreto sobre a susceptibilidade desta assegurar o pagamento da quantia exequenda e do acrescido» e não, diga-se agora, do facto de supervenientemente se reunirem na mesma entidade as qualidades de garante e do executado.

Com efeito, como se ponderou nesse douto Acórdão, para cuja doutrina, à míngua de melhores argumentos, com a devida vénia, se remete, «Poderá, eventualmente, argumentar-se que, dada a natureza pessoal da garantia bancária, sendo esta prestada pelo próprio devedor nada

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acrescenta ao direito do credor, que não vê por esse modo ser mais ou melhor assegurada a satisfação dos seus direitos. Isto porque todo o património (rectius, todos os bens penhoráveis) do devedor responde pelas suas dívidas, constituindo a garantia geral, ou comum, dos credores (cfr. arts. 601º e 807º do CC). // Mas, salvo o devido respeito, essa argumentação ignora a já referida característica essencial da garantia bancária, qual seja a sua autonomia relativamente à obrigação principal, à obrigação da Executada para com a Fazenda Nacional. Como deixámos já dito, a ora Recorrida se interpelada para cumprir na condição de garante, não poderá opor à Fazenda Nacional excepção alguma que lhe assista enquanto Executada (sendo a garantia independente das vicissitudes que possa conhecer aquela relação principal), daí resultando, inequivocamente, que a garantia bancária por ela prestada constitui um importante acréscimo da segurança da Fazenda Nacional relativamente ao recebimento da dívida exequenda e do acrescido. Por outro lado, seria desproporcionado que, sendo o executado uma instituição bancária a quem é permitido conceder garantias, tivesse de se socorrer dos serviços de uma outra instituição quando pretende ela própria prestar garantia bancária).

Pode assim concluir-se que o simples facto de se reunirem na entidade reclamante, ora recorrida, as qualidades de executado e de garante, por efeito da incorporação por fusão a que se alude no ponto 5 do probatório, não põe em causa, ao invés do que sustenta a recorrente, nem a autonomia da garantia nem a idoneidade da mesma.

Não enferma, pois, a sentença recorrida do erro de julgamento que lhe é assacado, não se mostrando violados os arts. 52º da LGT e 169º e 199º, ambos do CPPT.».

1.4. Por despacho de fls. 466 dos autos, foi determinada a baixa dos autos para fixação do valor da causa.No Tribunal a quo, foi proferido a fls. 471 dos autos, o seguinte despacho: «Fixo à acção o valor de € 222.019,94, conforme indicado, por corresponder ao valor da garantia em discussão. Notifique as partes.».Notificadas as partes desse despacho, nada requereram.

1.5. Com dispensa dos vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, atenta a natureza urgente do

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processo, cumpre decidir em conferência.

2. Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:

1º No Serviço de Finanças (SF) do Porto foi instaurado em 26/11/2013 o PEF nº 3085199901036980, contra a executada Banco V…………., que alterou a sua designação para Banco X……….. S.A., por dívidas de imposto de selo e juros compensatórios do ano de 1995, no valor global de € 316.136.315,00 (fls. 33 e ss);

2º A referida executada apresentou reclamação graciosa, recurso hierárquico e impugnação judicial das referidas liquidações (fls. 36 e ss).

3º Tendo obtido deferimento parcial das reclamações graciosas (fls. 35 e ss);

4º Em 15.02.2002 a executada Banco X………. prestou garantia bancária emitida pela ora reclamante, Z………., no valor de € 222.019,94 (fls. 78);

5º O executado Banco X………., SA foi incorporado por fusão no Banco Z………., tendo este assumido todos os direitos e obrigações daquele;

6º O OEF por despacho de 15/11/2013 ordenou ao Reclamante a substituição da garantia prestada (fls. 93);

7º O reclamante requereu ao OEF a notificação de elementos mais precisos sobre a garantia a prestar (fls. 95);

8º Tendo o OEF respondido que pretendia apenas a substituição da entidade garante (fls. 98);

9º Deste despacho o reclamante apresentou reclamação judicial (fls. 110 e ss);

10º O OEF revogou o acto reclamado (fls. 127);

11º Por ofício de 19.06.2014 o OEF notificou a reclamante para prestar nova garantia (fls. 371);

12º Da referida notificação consta o teor seguinte:

Para cumprimento do despacho proferido pela chefe deste SF em 18.06.2014, no processo de reclamação (...) e tendo como suporte a informação nº 38-GD/2014, da

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unidade dos Grandes Contribuintes, nomeadamente nos seus arts. 124 a 129, os quais se transcrevem em anexo, fica V. Exa. por este meio notificado para no prazo de 15 dias a contar da assinatura do aviso de recepção, substituir a garantia bancária nº 125-02-0232464 prestada no PEF (...) por outra de igual valor, em virtude de, por via da incorporação do património do devedor principal no património do garante, aquela garantia ter passado a integrar a garantia geral da obrigação tributária, prevista no art. 50º da LGT, deixando de poder ser considerada idónea para efeitos de suspensão da execução fiscal, sendo necessário para tal, a prestação de uma garantia especial da obrigação em face do exposto do nº 1 do art. 199º do CPPT.

13º A informação nº 38-GD/2014, nos referidos arts. 124 a 129, tem o seguinte teor:«124. Em face do exposto, dada a natureza pessoal da garantia bancária autónoma, verifica-se, em resultado da incorporação do património do devedor principal no património do garante, que aquela passou a integrar a garantia geral da obrigação tributária, prevista pelo art. 50º da LGT.125. Assim, aquela garantia, sendo uma garantia pessoal prestada pelo próprio devedor/executado, nada acrescenta à garantia geral das obrigações, estabelecida nos artigos 50º da LGT e 601º do CC, devendo, por isso, ser considerada uma mera garantia aparente, tal como defendem Pedro Romano Martinez e Pedro Fuzeta da Ponte, In «Garantias de cumprimento», Almedina, Coimbra, 5ª edição, 2006, páginas 57 a 68.126. Em suma, perante uma garantia pessoal prestada pelo próprio devedor, se o património do devedor não for suficiente para saldar todas as suas dívidas, o credor tributário não terá qualquer reforço da probabilidade de cobrança do seu crédito, em virtude de não haver outra ou outras pessoas que também possam ser compelidas a pagar com os respectivos patrimónios, uma vez que tal garantia não pode ser considerada idónea para efeitos do art. 199º nº do CPPT por não constituir «meio susceptível de assegurar os créditos do exequente».127. Termos em que, deverá a Reclamante ser notificada para substituir a Garantia Bancária nº 125-02-0232464 prestada no PEF nº 3085199901036980 por outra de igual valor em virtude de, por via da incorporação do património do devedor principal no património do garante, aquela garantia ter passado a integrar a garantia geral da

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obrigação tributária, prevista pelo art. 50º da LGT deixando, assim, o credor tributário de ver reforçada a probabilidade de cobrança do seu crédito e, em consequência, deixando aquela garantia de poder ser considerada idónea para efeitos de suspensão da execução fiscal.128. Considerando que, conforme supra exposto, não basta a mera existência da garantia geral das obrigações - composta pelo conjunto de bens penhoráveis do devedor/executado - para que seja legalmente admissível a suspensão da execução fiscal; exigindo-se para o efeito, em face do disposto no nº 1 do artigo 199º do CPPT, que seja prestada uma garantia especial das obrigações.129. Nunca perdendo de vista que a constituição de garantias visa tutelar o credor tributário e que o principal risco contra o qual o deve pôr a coberto, atento o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, é a insolvência do devedor; ou como refere L. Miguel Pestana Vasconcelos, in “Direito das Garantias, Almedina, Coimbra, 2ª Edição, 2013 (pag. 55), quando a garantia «não proteger o credor de forma eficaz na insolvência, ela será praticamente imprestável para esse papel.» - (fls. 356 e ss);

14º Deste despacho a Reclamante deduziu a presente reclamação.

3. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou verificado o vício que o Banco Z……… (Z………) imputava ao acto reclamado acto que determinou, em Junho de 2014, a substituição da garantia bancária que esta entidade bancária prestara em 2002 na execução fiscal instaurada contra o Banco X………. (X……….) e que determinou a anulação desse acto. Procedência que radicou no entendimento de que, tal como invocado, não podiam considerar-se preenchidos, à luz do disposto nos arts. 52º da LGT e 169º, 199º e 217º do CPPT, os pressupostos legais que permitem à Administração Tributária determinar a substituição de uma garantia prestada e aceite como idónea para efeitos de suspensão da execução fiscal.Segundo a sentença recorrida, «Apesar da falta de definição legal de “garantia idónea”, não pode deixar de concluir-se, em face das normas contidas nos arts. 169º, 199º, e 217º do CPPT e art. 52º da LGT, que essa idoneidade depende da capacidade de, no caso de o órgão da execução ter de accionar a garantia prestada, ela

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se mostre apta a assegurar essa cobrança. Desde que se verifique que a garantia oferecida detém, em concreto, essa capacidade de, em caso de incumprimento do devedor, salvaguardar a cobrança da dívida garantida, ainda que sem onerar ou afectar de forma grave os interesses legítimos do executado, não há como recusar a sua idoneidade para o fim em vista. Na garantia bancária autónoma - seja ela simples seja ela «in first demand» - o garante responsabiliza-se perante o credor pelo pagamento de uma obrigação própria e não pelo cumprimento de uma obrigação alheia (do executado/devedor), embora se destine a proteger o credor contra o risco de incumprimento por parte do devedor.A prestação de garantia bancária resulta da actividade profissional do Banco, não se confundindo com o seu património, pelo que, no caso em apreço, a garantia prestada é a mesma. Ora, se a garantia prestada é a mesma, não pode, salvo melhor entendimento, defender-se que ela deixou de ser idónea ou passou a constituir a garantia geral das obrigações prevista no ad. 50º da LGT apenas porque por circunstâncias supervenientes o garante passou também a reunir a condição de executado.Em suma, entendemos que a garantia bancária decorre do desenvolvimento da actividade dos Bancos, pelo que, no caso concreto, a garantia prestada é a mesma, não sofreu qualquer alteração na sua essência, sendo irrelevante, por si só, que por fusão o executado passe a integrar a entidade garante. // Pelo exposto, a decisão reclamada que ordenou a substituição da garantia prestada não pode manter-se por ilegal.».

Segundo a Fazenda Pública, ora recorrente, a sentença padece de erro de julgamento em matéria de direito, na medida em que da conjugação das normas contidas no art. 52º da LGT e nos arts. 169º e 199º do CPPT resulta que a suspensão da execução fiscal depende da prestação e manutenção de “garantia idónea” e esta, para o ser, tem de consistir numa garantia especial (pessoal ou real) da obrigação tributária, pois só esta representa um reforço suplementar, qualitativo ou quantitativo, de segurança de pagamento do crédito exequendo, não podendo consistir numa garantia geral, constituída pelo conjunto de bens penhoráveis que compõem o património do devedor. Isto é, na óptica da recorrente, perante o elenco do tipo de garantias enunciado no art. 199º do CPPT seria «patente a

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opção do legislador pelas garantias especiais, quando institui a possibilidade do devedor obter a suspensão do PEF por via da prestação de garantia idónea», o que se compreenderia na medida em que «uma garantia só poderá ser idónea se, através dela, for possível tal reforço quantitativo ou qualitativo»; e, no caso vertente, tendo ocorrido a fusão, por incorporação, do banco devedor (X……..) no banco garante (Z………), desapareceu esse «reforço quantitativo e qualitativo caracterizador das garantias especiais», transformando-se a garantia bancária numa garantia geral, que não pode, por isso, continuar a considerar-se como “idónea” para o fim em vista. Mais advoga que a garantia bancária «institui uma relação triangular, que, in casu, por via da fusão da executada no garante (ora reclamante), deixou de existir.».Vejamos.Cumpre, desde logo e em primeiro lugar, salientar que a competência para a análise e decisão da questão relativa à necessidade de substituição de garantia prestada para manter suspensa a execução fiscal cabe exclusivamente à administração tributária (doravante, AT), pelo que, na presente reclamação, o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto reclamado tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face da sua fundamentação contextual, até porque o interessado só pode defender-se dos pressupostos que aí foram enunciados e dos quais se distraíram os efeitos lesivos. O que significa ser absolutamente inadmissível qualquer tentativa de justificar o acto por razões (de facto e de direito) que não constam da sua fundamentação, pois se assim não fosse o particular ver-se-ia surpreendido em juízo com a invocação de uma outra realidade e isso representaria uma contracção do seu direito de reclamação contenciosa contra os actos lesivos praticados no processo de execução fiscal.Razão por que se impõe, neste recurso, dar particular atenção à fundamentação do acto reclamado, isto é, às concretas razões que levaram a AT a exigir a prestação de nova garantia em substituição daquela que se encontra prestada desde 2002 pelo Z……., para aferir da legalidade desse acto e do erro de julgamento que vem imputado à sentença recorrida. A fundamentação aduzida no acto reclamado para exigir a substituição da garantia bancária prestada e que perdura há doze anos, é a seguinte: «em virtude de, por via da incorporação do património do devedor principal no

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património do garante, aquela garantia ter passado a integrar a garantia geral da obrigação tributária, prevista no art. 50º da LGT, deixando de poder ser considerada idónea para efeitos de suspensão da execução fiscal, sendo necessário para tal a prestação de uma garantia especial da obrigação em face do exposto do nº 1 do art. 199º do CPPT» (nosso sublinhado).Ou seja, a AT não afirma, em parte alguma, que a garantia bancária prestada pelo Z……… se tenha extinguido por força da reunião na mesma pessoa da qualidade de garante e de devedor operada na sequência da fusão ocorrida em 2004 por incorporação do banco devedor (X………) no banco garante (Z……..), ou que ela tenha cessado juridicamente por virtude de se ter quebrada a triangularidade da relação jurídica própria da garantia bancária, ou por virtude da perda de uma das características essenciais desta garantia: a sua autonomia em relação à dívida tributária exequenda. Aliás, a AT não invoca, sequer, que o contrato de garantia tenha deixado de se manter firme e válido na ordem jurídica (A relação

entre o banco garante e o beneficiário vem sendo qualificada entre nós, tanto pela doutrina como pela jurisprudência, como sendo uma relação contratual com carácter não sinalagmático, por criar apenas obrigações para o garante Ou seja, é, no essencial, um contrato outorgado entre o mandante da garantia e o garante, mas a favor de um terceiro (o beneficiário), só podendo o garante opor a este as excepções que constem do próprio texto da garantia, mas já não as derivadas da relação contratual que está na base daquela - cf. Menezes Cordeiro, Manual do Direito Bancário, 3ª ed. pág. 651, António Sequeira Ribeiro, Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Inocêncio Galvão Telles II vol. "Direito Bancário", pág. 311, Almeida Costa em co-autoria com Pinto Monteiro, Garantias bancárias. O contrato de garantia bancária a primeira solicitação, na Colectânea de Jurisprudência, Ano XI, Tomo 5, Galvão Telles, Garantia Bancária Autónoma in O Direito, ano 120º, 1988, III-IV; na Jurisprudência, entre outros, os Acs. do STJ de 3/05/2007 no proc. 07B840 e de 27/05/2010,).

O que afirma é, tão-somente, que as garantias, para poderem ser consideradas “idóneas” para efeitos de suspensão da execução fiscal, têm de ser garantias especiais, não podendo ser constituídas pelo próprio património do devedor, e que a circunstância de, por força da incorporação, o banco que prestou a garantia bancária ter passado a ser também o banco devedor da dívida exequenda, leva a concluir que ela se degradou numa garantia geral da obrigação tributária, o que não permite considerá-la como garantia idónea.Neste contexto, embora a Fazenda Pública venha agora invocar, em sede de recurso, que a garantia bancária

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prestada se extinguiu, porque ela «institui uma relação triangular, que, in casu, por via da fusão da executada no garante (ora reclamante), deixou de existir», o certo é que não foi essa a justificação enunciada no acto reclamado para a exigência de uma nova garantia e, como vimos, o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto sindicado tal como ele ocorreu, apreciando a respectiva legalidade em face, unicamente, da sua fundamentação contextual. Razão por que consideramos inaceitável que, em sede de recurso, se coloque e aprecie outra justificação para a exigência de nova garantia, isto é, se coloque e aprecie a questão de saber se o contrato de garantia bancária celebrado entre o Z……. e a beneficiária credora (AT) cessou ou perdeu validade jurídica, e se, à luz dessa outra justificação, podia a AT exigir a prestação de nova garantia. Em suma, o que importa analisar é, somente, se a garantia bancária prestada em 2002 e cuja subsistência na ordem jurídica não foi questionada, deixou de poder ser considerada “idónea” por se ter degradado em garantia geral da obrigação, por força da transferência global do património do banco executado para o banco garante, e a lei só considerar idóneas as garantias especiais da obrigação tributária. Na verdade, o que a AT argumenta é que, à luz do disposto no art. 52º da LGT e no art. 199º do CPPT, as garantias, para serem idóneas, têm de ser especiais, e nunca gerais, isto é, não podem ser constituídas pelo património devedor que assegura a realização coactiva da dívida exequenda.Argumentação que é incorrecta, desde logo porque é legalmente inquestionável que uma das formas de prestação de garantia idónea é a penhora de bens do próprio património do devedor, património que constitui garantia geral da obrigação tributária, sendo que a penhora em si, enquanto acto executivo, não representa nem constitui uma garantia especial mas, tão só, o acto processual de individualização dos bens desse património geral do devedor que vão responder pelo pagamento da dívida.Com efeito, nos termos do disposto no art. 601º Cód. Civil, o património do devedor (mais concretamente todos os bens susceptíveis de penhora) responde pelas suas dívidas, constituindo a garantia geral das suas obrigações. E, nos termos do nº 1 do art. 199º do CPPT, constituirá garantia idónea, para efeitos de suspensão da execução, qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do

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exequente, valendo como tal a penhora de bens do património geral do devedor que assegurem o pagamento da dívida exequenda (nº 4), pese embora exista, nesse caso, elevado risco de a AT não conseguir a satisfação integral do seu crédito – seja porque posteriormente não consegue vender os bens penhorados, seja porque eles são vendidos por um valor muito inferior ao que consta do acto da penhora, seja, ainda, porque eles podem ser aprendidos para a massa insolvente no caso de o devedor entrar em insolvência e ocorrer um processo de execução universal e concursal dos seus bens (o que inclui, naturalmente, a apreensão para a massa insolvente de todos os bens penhorados na execução fiscal e que integravam a garantia prestada e aceite como idónea).Não se pode, portanto, acompanhar a argumentação da AT, e que a Fazenda Pública sustentou neste recurso, no sentido de que o conjunto de bens que compõe o património do devedor nunca pode constituir uma garantia idónea, por traduzir uma realidade flutuante que se pode tornar insuficiente, e que «o aspecto central das garantias é que não sejam atingidas pela insolvência do devedor, pelo que elas serão imprestáveis se não protegerem de forma eficaz os credores neste casos». Como se viu, não foi essa a opção do legislador, que expressamente autorizou que a garantia pudesse ser constituída por qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente, designadamente pelos próprios bens do património do devedor, individualizados por acto de penhora, sem impor a exigência de reforços suplementares de segurança (quantitativos ou qualitativos) que confiram especiais garantias à AT em caso de insolvência do devedor. Em suma, o património do devedor é susceptível de constituir garantia idónea da obrigação tributária, desde que submetido a acto executivo de penhora, acto que, apesar de evitar a alienação e oneração dos bens penhorados, não acautela a deterioração e perda de valor de mercado desses bens. O que, desde logo, faz cair por terra o principal argumento apresentado pela Recorrente: o argumento de que perante o incumprimento do banco que prestou a garantia e que assumiu as obrigações tributárias do devedor, isto é, perante o incumprimento do Z…….., «apenas os bens que integram o seu património geral servirão para o cumprimento da dívida, não tendo o credor tributário qualquer privilégio perante os demais credores, situação que o legislador pretendeu evitar quando institui a necessidade de prestação de garantia

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idónea para suspensão da execução fiscal.».Para além de que esse argumento é falacioso, na medida em que um banco que se responsabiliza através de garantia bancária também só responde com o conjunto de bens que integram o seu património geral em caso de accionamento da garantia, não conferindo esta garantia um privilégio ao credor perante os demais credores em caso de insolvência do devedor principal. A garantia bancária visa assegurar que o beneficiário receberá, nas condições previstas no texto da garantia, uma determinada quantia em dinheiro, servindo, como diz Galvão Telles na obra supra citada, como um “sucedâneo prático de um depósito que tem a vantagem de não se efectuar”, assumindo a entidade garante uma obrigação própria, desligada da dívida exequenda, autónoma e independente, não acessória da obrigação do devedor principal. (Como explicam Almeida Costa e Pinto Monteiro na

obra citada, a garantia bancária é uma garantia tão segura para o beneficiário como o depósito de dinheiro ou valores, mas sem o inconveniente da imobilização da riqueza, o que é tanto mais significativo quanto estão envolvidas somas pecuniárias avultadas, pois “tudo se passa (...) como se o banco, no momento que se obrigou perante o beneficiário tivesse depositado à ordem

deste o montante estipulado na garantia”.) Pelo que, o que em última análise importa para a análise da idoneidade da garantia bancária é a capacidade de o património geral da entidade bancária assegurar a cobrança no caso de ter de ser accionada a garantia, ou, mais precisamente, de essa entidade efectuar o pagamento da dívida autónoma que assumiu perante o credor/ beneficiário. Razão por que, como tem sido acentuado pela doutrina e pela jurisprudência, a garantia idónea tem de ser avaliada de forma casuística, em face da susceptibilidade de o património geral da entidade garante poder responder pelo cumprimento da dívida que assumiu como própria, olhando à suficiência e solidez do seu património e à sua solvência.Como se deixou afirmado no acórdão do STA de 18/06/2014, no proc. nº 507/14, na garantia bancária autónoma – seja ela simples, seja «in first demand» – o garante responsabiliza-se perante o credor pelo pagamento de uma obrigação própria e não pelo cumprimento de obrigação alheia (do executado/devedor), embora se destine a proteger o credor contra o risco de incumprimento por parte do devedor. Pelo que, apesar da falta de definição legal de “garantia idónea”, não pode deixar de concluir-se, em face das normas contidas nos

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arts. 169º, 199º e 217º do CPPT e art. 52º da LGT, que essa idoneidade depende da capacidade de, no caso de o órgão da execução ter de accionar a garantia prestada (ou, mais precisamente, de efectuar o pagamento da dívida em cobrança através do património do banco garante), ela se mostre apta a assegurar essa cobrança. Desde que se verifique que a garantia oferecida detém, em concreto, essa capacidade de, em caso de incumprimento do devedor, salvaguardar a cobrança da dívida garantida, não há como recusar a sua idoneidade para o fim em vista.Assiste, pois, total razão ao ora recorrido quando afirma que a função da garantia autónoma não é a de garantir o pontual cumprimento da dívida exequenda, antes é a de assegurar que o beneficiário receberá, nas condições previstas no texto da garantia, uma determinada importância pecuniária, e esta função em nada é prejudicada pela reunião na mesma pessoa da qualidade de devedor e de garante, já que a relação relevante na perspectiva do beneficiário (AT) é a que foi por si estabelecida com o garante (Z…….). Por outras palavras, a responsabilidade da entidade incorporante por débitos da entidade incorporada não exclui as demais hipóteses de responsabilidade legal e contratual da própria incorporante, designadamente a responsabilidade que assumiu pelo cumprimento do contrato de garantia bancária que celebrou em benefício da AT em reforço ao crédito tributário.Por conseguinte, o que releva e importa saber é se, por via da incorporação, a obrigação de resultado que o Z…….. assumiu perante a AT sofreu alguma alteração, pois se tal não aconteceu não pode considerar-se afectada a idoneidade da garantia bancária prestada e que permanece válida na ordem jurídica (pois, como se viu, a sua existência e validade nunca foram questionadas).Neste contexto, não merece qualquer censura a sentença recorrida ao ter julgado que resultando a garantia bancária da actividade profissional de entidades bancárias, a garantia bancária contratualizada e prestada pelo Z……… a favor da AT é a mesma após a operação de fusão. «Ora, se a garantia prestada é a mesma, não pode, salvo melhor entendimento, defender-se que ela deixou de ser idónea ou passou a constituir a garantia geral das obrigações prevista no ad. 50º da LGT apenas porque por circunstâncias supervenientes o garante passou também a reunir a condição de executado. Em suma, entendemos que a garantia bancária decorre do desenvolvimento da

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actividade dos Bancos, pelo que, no caso concreto, a garantia prestada é a mesma, não sofreu qualquer alteração na sua essência, sendo irrelevante, por si só, que por fusão o executado passe a integrar a entidade garante.».E como também se deixou explicado no Acórdão do STA de 14/08/2013, no proc. nº 01315/13, cuja posição se sufraga face à sua convincente e desenvolvida motivação, nada obsta a que o executado, sendo uma instituição bancária autorizada a conceder garantias bancárias no exercício de actividade sujeita a estrita regulamentação e supervisão, possa surgir como garante, pois tal não põe em causa a autonomia da garantia bancária, não influindo, assim, sobre a idoneidade da garantia. «Por certo, a ora Recorrida, se interpelada na sua qualidade de instituição bancária garante, não deixará de cumprir com as suas obrigações para com a beneficiária da garantia (a Fazenda Nacional). // Poderá, eventualmente, argumentar-se que, dada a natureza pessoal da garantia bancária, sendo esta prestada pelo próprio devedor nada acrescenta ao direito do credor, que não vê por esse modo ser mais ou melhor assegurada a satisfação dos seus direitos. Isto porque todo o património (rectius, todos os bens penhoráveis) do devedor responde pelas suas dívidas, constituindo a garantia geral, ou comum, dos credores (cfr. arts. 601.º e 807.º do CC). // Mas, salvo o devido respeito, essa argumentação ignora a já referida característica essencial da garantia bancária, qual seja a sua autonomia relativamente à obrigação principal, à obrigação da Executada para com a Fazenda Nacional. Como deixámos já dito, a ora Recorrida se interpelada para cumprir na condição de garante, não poderá opor à Fazenda Nacional excepção alguma que lhe assista enquanto Executada (sendo a garantia independente das vicissitudes que possa conhecer aquela relação principal), daí resultando, inequivocamente, que a garantia bancária por ela prestada constitui um importante acréscimo da segurança da Fazenda Nacional relativamente ao recebimento da dívida exequenda e do acrescido.Por outro lado, seria desproporcionado que, sendo o executado uma instituição bancária a quem é permitido conceder garantias, tivesse de se socorrer dos serviços de uma outra instituição quando pretende ela própria prestar garantia bancária.».

A tudo isto acresce, como bem salienta o Ministério Publico junto do STA, que no acto reclamado não foi

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invocada matéria integrante dos pressupostos que a lei exige para permitir a exigência de uma nova garantia (nº 10 do art. 199º do CPPT) e que passam pela “diminuição significativa do valor dos bens que constituem a garantia”prestada.Com efeito, nunca foi invocado que tenha ocorrido uma diminuição significativa do valor dos bens do património do Z…….. que integram a obrigação autónoma de pagamento que este banco assumiu perante a AT mediante a garantia contratualizada, ou que tenham aumentado os riscos de uma menor solidez ou solvabilidade desse banco. Razão porque se impõe concluir que essa garantia se mantém inalterada em todos os aspectos que relevam na relação com o beneficiário (AT). E sabido que o Z…….., se interpelado para cumprir na condição de garante, não poderá opor à AT excepção alguma que lhe assista enquanto executado, torna-se inequívoco que a garantia bancária que prestou constitui um importante acréscimo da segurança da AT relativamente ao recebimento da dívida exequenda e do acrescido.Em suma, o fundamento invocado no acto reclamado não integra o elenco dos pressupostos que a lei prevê para possibilitar a exigência de prestação de nova garantia, nem constitui parâmetro relevante no juízo de aferição da idoneidade da garantia prestada e oportunamente aceite como idónea, só podendo a AT exigir a sua substituição por outra se pudesse concluir, perante razões concretas e objectivas que teriam de estar enunciadas na fundamentação do acto, que aquela já não garante, em concreto, o integral pagamento da quantia exequenda e do acrescido. Pelo que, ao utilizá-lo, a AT incorreu em violação de lei determinante da anulação do acto reclamado.Por todo o exposto se conclui que a sentença recorrida não merece censura no que a esta questão diz respeito.E porque a questão relativa à omissão de fixação do valor da causa, colocada pela recorrente nas conclusões Y) a BB), já se encontra ultrapassada pela prolação, no tribunal a quo, do despacho de fls. 471 dos autos, conforme supra referido, mostra-se prejudicado o conhecimento dessa questão, nada mais havendo a apreciar e a decidir neste recurso.

4. Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.Custas pela recorrente.

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Lisboa, 11 de Março de 2015. - Dulce Neto (relatora por vencimento) - Ascensão Lopes - Ana Paula Lobo.

Voto de vencida

Não acompanho a solução adoptada pelo acórdão que antecede, pelas razões que passo a enunciar:

No processo de execução apenso, o executado, Banco V…………., que alterou a sua designação para Banco X………….. SA., prestou uma garantia bancária em que era entidade garante o reclamante para obter a suspensão dos termos da execução, como veio a ocorrer.Na pendência da execução verificou-se uma fusão por incorporação do executado no banco garante. Tal significa que, por força do disposto no artº 112.º do Código das Sociedades Comerciais, com a inscrição da fusão no registo comercial: Extinguiu-se a sociedade incorporada que era executada, transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante, o banco garante, tornando-se os sócios da sociedade extinta sócios da sociedade incorporante. Tal registo da fusão, com efeito constitutivo, operou a transmissão, automática e universal, para a sociedade incorporante de todos os direitos e obrigações da sociedade incorporada ou fundida, passando a existir um património único e um único conjunto de sócios.Assim, o executado passou a ser a entidade garante, porque deixaram de existir duas pessoas jurídicas distintas, sem haver ocorrido a extinção da execução fiscal em causa.Em teoria, pode admitir-se que a garantia geral do crédito tributário sob execução se alargou, se a solvabilidade económica e financeira da entidade bancária reclamante, após a fusão é de grau superior àquela que tinha a sociedade fundida, mas a realidade pode não o confirmar.Todavia, apesar do património do devedor ser sempre, independentemente do seu real valor uma garantia geral dos créditos tributários, em caso de cobrança coerciva de créditos tributários, entendeu o legislador que, fosse qual fosse o património do devedor, e, fosse qual fosse o montante da dívida exequenda, para suspender a sua cobrança coerciva teria o devedor que prestar caução idónea – artº 52º da Lei Geral Tributária – verificadas que sejam, concomitantemente uma qualquer das situações

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expressas no seu nº 1. Se o não fizer, o processo executivo prossegue os seus termos e queda-se, depois de efectuada a penhora em bens suficientes para garantir o montante em dívida, artº 169º, CPPT.A garantia idónea, refere o artº 199º do Código de Procedimento e Processo Tributário pode ser uma garantia bancária, caução, seguro caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente. Mas esse qualquer meio de assegurar os créditos do exequente não pode ser o património do devedor que é uma garantia geral do crédito tributário.A garantia geral das obrigações, seguindo os ensinamentos repetidos em todos os manuais de direito das obrigações, mas, particularmente o Profº Dr.º Teles de Menezes Leitão, in, Garantias das Obrigações, Almedina, é «a faculdade que a lei atribui ao credor de executar o património do devedor, principal tutela jurídica de que goza o direito de crédito, representa uma forma de assegurar ao credor a realização, do seu direito, e nesse sentido constitui naturalmente uma garantia. (...).A garantia especial das obrigações, seguindo o mesmo autor, «A garantia especial representa um reforço suplementar de segurança atribuído a alguns ou alguns dos credores, em relação à garantia comum, que é conferida pelo património do devedor. Esse reforço da garantia que representa a garantia especial varia, consoante se trate de garantias pessoais ou de garantias reais.Na garantia pessoal, esse reforço consiste em instituir uma obrigação secundária, assumida por um devedor diferente, o que implica uma segunda aplicação, também em relação a este, do mecanismo da garantia geral das obrigações. As garantias pessoais caracterizam-se assim por implicarem um reforço da garantia geral, tomando responsáveis à face do credor outra ou outras pessoas diferentes, o que implica consequentemente a vinculação dos patrimónios destas à satisfação do direito de crédito. Para além disso, normalmente o garante da obrigação assegurada adquire, em caso de pagamento, ou o crédito, em resultado da sub-rogação, ou um direito de regresso sobre o primitivo devedor.Na garantia real, esse reforço traduz-se antes em instituir uma afectação de bens, quer do devedor, quer de terceiro, ao pagamento preferencial de certas dívidas. »Mais adiante, refere ainda o mesmo autor, pag. 246 e segs «A penhora consiste numa apreensão judicial dos bens do executado (seja ele o devedor ou terceiro) afectos à

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garantia da obrigação exequenda, em ordem a que eles possam ser sujeitos aos fins da acção executiva, a saber, a satisfação do direito do credor exequente e, eventualmente, do dos outros credores com garantia real sobre esses bens. (...) Efectivamente, enquanto que antes da penhora o credor dispõe apenas da garantia geral incidente sobre o património do devedor, após a penhora adquire uma garantia especial incidente sobre bens determinados. (…) Finalmente, a penhora desempenha uma função de garantia, na medida que em confere ao exequente o direito de ser pago, com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior sobre os bens penhorados (art. 822.°, n.° 1). A anterioridade da garantia é determinada pela data do registo, no caso de bens imóveis e móveis sujeitos a registo (cfr. art. 2.°, n.° 1 n) e 6°, n.° 1, CRP), pela data da hora da diligência, no caso de a penhora incidir sobre bens móveis não registáveis e pela data da notificação ao obrigado em relação a direitos. Caso, porém, a penhora seja precedida de arresto, a sua anterioridade é reportada à data do arresto (art. 822°, n.° 2). Precisamente para admitir a graduação, das outras garantias reais em confronto com a penhora vem o art. 864.°, n.° 3, b) CPC prever a citação dos credores com garantia real sobre os bens executados, os quais são admitidos a reclamar o seu crédito na acção executiva, caso disponham de título executivo (art. 865.° CPC).E, ainda, adiante, pag. 251, «(…) Efectivamente, independentemente da forma como se estabelece a garantia, não há dúvida que a penhora atribui ao exequente um direito sobre uma coisa corpórea, oponível erga omnes, que lhe atribui preferência no pagamento sobre a venda desse mesmo bem. Não há assim qualquer obstáculo à inserção da penhora entre as garantias reais».Na presente situação, como só há um património, o do devedor - no qual se fundiu o património do executado inicial com o património do garante - não há, verdadeiramente qualquer garantia idónea para suspender a execução, porque só há o património do devedor que é uma garantia geral, inexistindo qualquer garantia especial para aferir da sua idoneidade. Não havendo garantia especial, não há garantia susceptível de suspender os termos da execução, muito menos dotada de qualquer espécie de idoneidade, porque só uma garantia existente pode ser sujeita a escrutínio, em concreto, de idoneidade.Estávamos perante uma garantia bancária, com um

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regime diverso da fiança em vários aspectos, todavia esta situação encontra-se claramente definida para o regime da fiança, garantia acessória da obrigação principal e muito mais antiga que a garantia bancária, de cunho marcadamente pessoal, e, onde a reunião na mesma pessoa das qualidades de devedor e fiador, extingue a fiança, excepto se o credor tiver legítimo interesse na subsistência da garantia – artº 871º, nº 3 do Código Civil -.Historicamente sabemos que se foi avançando, num reforço contínuo dos interesses do credor, sobretudo por imperativos do comércio internacional, das garantias acessórias da obrigação principal, como seria a fiança, para recurso à fiança com renúncia ao benefício da excussão prévia, pela qual o fiador se tornava "principal pagador", para a subfiança, em que um terceiro, o subfiador, vem afiançar o fiador perante o credor, para um momento que se seguiu à II Guerra Mundial onde se tornou premente a utilização de garantias que não estivessem sujeitas às vicissitudes da relação que visavam garantir.Nasceram então as garantias prestadas por bancos sem a qualidade de acessoriedade da obrigação que visavam garantir, onde se não poderiam opor ao beneficiário da garantia quaisquer questões emergentes da relação negocial garantida, para além do incumprimento por parte do terceiro garantido.Esta autonomia da garantia bancária relativamente ao contrato base é o traço de distinção entre ela e a fiança. Dela resulta uma maior segurança para o credor do que a fiança por o garante não lhe poder opor as excepções de que o devedor/garantido se pode arrogar, e para o devedor por o não obrigar ao depósito do valor garantido com a correspondente imobilização desse capital. Naturalmente que a vantagem do devedor tem um custo correspondente à comissão que paga ao banco pela prestação da garantia.Seguindo a «visão gráfica» de Galvão Telles, in Garantia Bancária Autónoma, O Direito, Ano 120, pág. 275 e seguintes diremos que "a garantia autónoma é uma figura triangular", composta por três relações distintas. Assim:«I) Primeiramente, A e B, dois entes dotados de capacidade jurídica, decidem celebrar entre si um contrato (compra e venda, empreitada, cooperação industrial, etc.), designado de contrato-base. Nele acordam que A fica adstrito à obrigação de conseguir um garante que assegure o cumprimento das suas obrigações perante B mediante certa quantia pecuniária.

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II) Em ordem a cumprir essa obrigação, A (devedor do contrato-base e agora dador da ordem, ordenador ou garantido) negoceia com o banco C (mandatário e garante), que se obriga, em troca de determinada retribuição, a celebrar com B um determinado contrato de garantia, salvaguardando o seu direito de reembolso imediato pelo devedor.III) Finalmente, C negoceia com B (agora beneficiário da garantia), assumindo como sua e autónoma a obrigação de prestar uma garantia a favor deste último ou, por outras palavras, de lhe entregar certa pecunia, logo que B prove o incumprimento do devedor do contrato-base (contrato autónomo de garantia simples) ou imediatamente (contrato autónomo de garantia à primeira solicitação). É, pois, neste momento que se celebra o contrato autónomo de garantia propriamente dito, que tem como sujeitos o beneficiário, enquanto credor, e o banco garante, como devedor.»

Pese embora não existir na execução fiscal uma obrigação contratual a cargo do devedor o funcionamento da garantia bancária não assume qualquer divergência do antes indicado.Na fiança o fiador compromete-se perante o credor a pagar a dívida do devedor principal, se este o não fizer, confundindo-se o objecto da fiança com o objecto da dívida afiançada. Na garantia autónoma, o garante não se obriga a satisfazer uma dívida alheia mas assegura ao beneficiário o recebimento de certa quantia em dinheiro, desde que o beneficiário diga que o devedor não cumpriu o contrato garantido, sem que o garante possa invocar em seu benefício questões relativas ao cumprimento das obrigações do contrato firmado entre o credor beneficiário e o devedor garantido, sendo, por isso, completamente diverso o objecto da garantia autónoma e o objecto da obrigação decorrente do contrato-base, aqui pagamento da quantia exequenda.Tudo para concluir que se na fiança era claro que a confusão na mesma pessoa jurídica da qualidade de fiador e de devedor implicaria a sua extinção, não dispondo sequer a Administração Tributária de poderes para invocar interesse legítimo na subsistência da fiança neste caso, a solução não pode ser diversa quando em causa está uma garantia bancária, com a supra referida relação triangular que perde um dos seus lados com a reunião, na mesma pessoa jurídica, do devedor e do garante.O banco garante não se pode apresentar a prestar uma

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garantia bancária para suspender um processo de execução fiscal em que é executado. A circunstância de a dívida fiscal em causa ser da responsabilidade, outrora de um banco que o garante incorporou, não é diversa da que se verificaria relativamente a uma execução fiscal em que o banco garante fosse, desde a sua instauração o executado. Mas os executados não podem prestar garantias bancárias nas execuções fiscais em que são a parte passiva. Podem, os executados, mesmo quando sejam bancos, que profissionalmente exercem a actividade bancária, onde se incluiu a actividade de prestar garantias bancárias, apresentar outras garantias idóneas, desde logo as cauções, seguros de caução, etc.O sentido de estarmos perante uma garantia autónoma é termos uma entidade diversa do devedor a garantir à Administração Tributária que o valor em dívida será pago se o executado o não fizer, e, na situação presente não há essa terceira entidade, exterior à relação jurídico-tributária material controvertida a garantir a satisfação do montante exequendo, sem discussão da relação jurídico-tributária, porque é também o garante que na qualidade de executado, de sujeito passivo da obrigação tributária está a discutir a sua legalidade.A não ser assim, mal se compreende que, desde o início todos os bancos que sejam executados em execução fiscal não possam, eles próprios, emitir uma garantia para, reunidos os outros pressupostos legais, obterem a suspensão dos termos da execução fiscal. Como ter-se-á que aceitar que possam substituir a garantia que ofereceram, anteriormente prestada por diversa entidade bancária, com os encargos que lhe são inerentes, pela prestação da sua própria garantia, pois facilmente demonstrarão terem interesse relevante na substituição de um garantia bancária por outra.

Lisboa, 11 de Março de 2015. Ana Paula Lobo.

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